UPE 2012

Navegando rumo ao espaço escolar

Com base no meu conhecimento da realidade escolar brasileira, não me resta dúvida de que o grande problema para a superação do analfabetismo digital e/ou para a aprendizagem do manejo de computadores pelas novas gerações reside num elemento-chave: o professor. Sem que o professor esteja objetivamente habilitado para o uso dos computadores, incluindo aqui o domínio dos principais programas e das principais linguagens para a produção/recepção de informações virtuais, serão mínimas as chances de uma socialização da Internet no espaço escolar ou, se quiser, será muito lento esse processo, retardando sobremaneira o usufruto dos seus benefícios pela maioria da população brasileira.

 

A profissionalização dos professores vem sofrendo uma corrosão crescente nestes últimos tempos. A formação básica, em decorrência de um aumento exponencial de faculdades particulares de condição duvidosa, e a formação continuada, nem sempre assumida rigorosamente pelos governos, ainda deixam muito a desejar. Some-se a isso o baixo salário e outras péssimas condições de trabalho no magistério, transformando as dificuldades dessa área em grandes desafios. Para alguns, considerando o descaso histórico e a atual indiferença em relação ao chamado “ensino de qualidade”, os problemas relacionados à formação de professores são quase que intransponíveis, descartando quaisquer iniciativas duradouras no tempo e que gerem efeitos significativos nas salas de aula.

 

Some-se a essa desgraça a tradição secular do chamado “ensino de giz-e-lousa”. Desde 1930, esse esclerosado paradigma e todos os ranços de uma pedagogia baseada na saliva foram recorrentemente criticados, havendo, inclusive, propostas sadias para substituição das velhas metodologias que levam a uma aprendizagem mecânica e repetitiva, conforme criticava Paulo Freire. Entretanto, sabe-se lá a teia complexa de fatores que agem sobre a educação escolarizada brasileira, o estilo “giz-e-lousa” sempre encontrou maneiras de permanecer ou, então, de ressurgir ainda mais forte no transcorrer dos tempos. Outrossim, os demais instrumentos para a produção do ensino, inclusive dos computadores, quase sempre ficam na periferia daquele estilo básico, sendo aprendidos e utilizados, em termos de manejo, muito mais fora da escola que dentro dela.

 

No que se refere ao espaço escolar propriamente dito, convém insistir nas carências que resultam da falta de investimentos contínuos e/ou são consequências – apenas – de entusiasmos passageiros dos governos em início de gestão, fazendo que os poucos ou parcos investimentos passem a significar absolutamente nada. Isso porque não levam em conta dois fatores fundamentais: (1) o próprio professor que, como afirmado no início dessa reflexão, é o condutor responsável pelo “bonde” do ensino; é o principal agente de facilitação da aprendizagem dos estudantes e sem ele quaisquer propostas de inovação não vingam nem se sustentam na prática; e (2) a nova estrutura da administração da escola, que deve agora contar com novos profissionais para dar conta das novas funções assimiladas em benefício da formação dos estudantes. Exemplificando: caso a escola passe a fornecer merenda, a contratação de uma nutricionista torna-se imprescindível; caso venha a ter uma biblioteca, deve possuir um bibliotecário para organizar esse espaço; caso passe a contar com um laboratório ou sala de informática, a presença de um técnico ou graduado nessa área é fundamental.

 

O problema é que os governos escamoteiam essas necessidades, atribuindo aos próprios professores o cumprimento das novas funções agregadas à organização – funções muito além da formação básica para o exercício do magistério (também precária, como foi visto acima). Nesses termos, morrem na praia, depois de certo tempo de operação (passado o entusiasmo do ritual de inauguração do espaço), as tentativas de enriquecer o ensino-aprendizagem com instrumentos mais sofisticados do que apenas o giz e a lousa e os exercícios de cópia a partir dos rotineiros comandos verbais dos professores. Daí, na maior parte das vezes, a aprendizagem do manejo da mídia – exatamente igual ao que ocorre com a aprendizagem da língua inglesa (sem laboratórios nas escolas e com professores fraquíssimos em termos de domínio) – ser feita fora da escola, ao sabor das escolinhas de informática que faturam quanto querem em decorrência do fracasso das escolas públicas nessa área.

In: SILVA, E. T. A leitura nos oceanos da Internet. São Paulo: Cortez, 2003. p. 53-55 (com adaptações).

 

Ainda que o texto seja escrito no padrão normativo da língua portuguesa, há uma passagem em que o autor utiliza uma construção que se afasta desse padrão. Assinale-a.

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