UFRGS 2019

 

1Recebi consulta de um amigo que tenta 2deslindar segredos da língua para estrangeiros que querem aprender português. 3Seu problema: “se digo em uma sala de aula: ‘Pessoal, leiam o livro X’, como explicar a concordância? 4Certamente, não se diz 5‘Pessoal, leia o livro X’".

Pela pergunta, vê-se que não se trata de fornecer regras para corrigir eventuais problemas de padrão. Trata-se de entender um dado que ocorre regularmente, mas que parece oferecer alguma dificuldade de análise.

Em primeiro lugar, é óbvio que se trata de um pedido (ou de uma ordem) mais ou 6menos informal. Caso contrário, não se usaria a expressão “pessoal”, mas talvez “Senhores” ou “Senhores alunos”.

Em segundo lugar, não se trata da tal concordância ideológica, nem de silepse (hipóteses previstas pela gramática para explicar concordâncias mais ou menos excepcionais, que se devem menos a fatores sintáticos e mais aos semânticos; 7exemplos correntes do tipo “A gente fomos” e “o pessoal gostaram” se explicam por esse critério). Como se pode saber que não se trata de concordância ideológica ou de silepse? A resposta é que, 8nesses casos, o verbo se liga ao sujeito em estrutura sem vocativo, diferentemente do que acontece 9aqui. E em casos como “Pedro, venha cá”, “venha” não se liga a “Pedro”, 10mesmo que pareça que sim, porque Pedro não é o sujeito.

11Para tentar formular uma hipótese 12mais clara para o problema apresentado, 13talvez 14se deva admitir que o sujeito de um verbo pode estar apagado e, mesmo assim, produzir concordância. O ideal é que se mostre que o fenômeno não ocorre só com ordens ou pedidos, e nem só quando há vocativo. Vamos por partes: a) 15é normal, em português, haver orações sem sujeito expresso e, mesmo assim, haver flexão verbal. 16Exemplos 17correntes são frases como “chegaram e saíram em seguida”, que todos conhecemos das gramáticas; b) sempre que há um vocativo, em princípio, o sujeito pode não aparecer na frase. É o que ocorre em “meninos, saiam daqui”; mas o sujeito pode aparecer, pois 18não seria estranha a sequência “meninos, vocês se comportem”; c) 19se 20forem aceitas as hipóteses a) e b) (diria que são fatos), não 21seria estranho que a frase “Pessoal, leiam o livro X” pudesse ser tratada como se sua estrutura fosse “Pessoal, vocês leiam o livro x”. Se a palavra “vocês” não estivesse apagada, a concordância se explicaria normalmente; d) assim, o problema 22real não é a concordância entre “pessoal” e “leiam”, mas a passagem de “pessoal” a “vocês”, que não aparece na superfície da frase.

Este caso é apenas um, dentre tantos outros, que nos obrigariam a considerar na análise elementos que parecem não estar 23na frase, mas que atuam como se 24lá estivessem.

 

Adaptado de: POSSENTI, Sírio. Malcomportadas línguas. São Paulo: Parábola Editorial, 2009. p. 85-86.

 

Considere os usos de advérbios no texto e assinale com 1 aqueles em que o advérbio modifica o sentido de apenas uma palavra e com 2 aqueles em que modifica o sentido de segmentos textuais.

 

(     ) Certamente (ref. 4)

(     ) menos (ref. 6)

(     ) mais (ref. 12)

(     ) talvez (ref. 13)

 

A sequência correta de preenchimento dos parênteses, de cima para baixo, é 

Escolha uma das alternativas.