UFV 2001

TEXT O PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
Violência e drogas

1 É sempre bacana ver milhares juntando as forças, as vontades, as desesperanças, para encher ruas com o alvo vestuário da paz. Não é muito a minha, esse negócio de acender vela e clamar ao firmamento, mas em respeito aos sincretismos biodiversos, topo fingir não crer que do céu só vem relâmpago, chuva e bala perdida.
2 O que não dá mais, sinceramente, pra encarar com graça, educação e simpatia é o lugar-comum "não se pode dissociar a questão da violência da questão das drogas". Hoje em dia, 10 entre 10 autoridades públicas, ao se pronunciarem a respeito do tema, repetem em uníssono: "Não se pode dissociar a questão da violência da questão das drogas". E daí? O que devemos concluir dessa brilhante assertiva? É óbvio que as duas coisas estão intrinsecamente ligadas, qualquer idiota Iobotomizado sabe. Mas o que vem depois disso? É "não se pode dissociar a questão da violência da questão das drogas" e ponto final? Quer dizer então que é só ninguém mais se drogar que a violência acaba? Quer dizer então que se os ricos (como acusou o governador do Rio de Janeiro) pararem de consumir substâncias ilegais tudo estará resolvido?
3 Bacana. Muito bom. E que dia vai ser isso? Uma bela manhã todos acordaremos para viver num mundo melhor, onde todos os que consomem drogas terão uma crise de consciência e, junto com seus fornecedores, chegarão à conclusão de que já perturbaram demais a ordem pública, de que a vida de todos já está suficientemente aterrorizada e, portanto, todos vão se dedicar a atividades mais lúdicas.
4 Vamos ou não vamos, de uma vez por todas, encarar a dura realidade de que sempre existirá uma parcela qualquer da população que vai querer se drogar? Isso não é minha opinião, muito menos meu desejo. E assim, simplesmente, porque sempre foi assim e continuará sempre sendo assim. Em qualquer sociedade, em qualquer época. Qualquer um que se dê ao trabalho de pesquisar as origens históricas do ato de se drogar, vai ficar chocado com a antiguidade da prática.
5 Enquanto a sociedade não oferecer uma alternativa legal ao adulto que quer consumir, arcará com o custo (de vida, de grana, de desagregação das estruturas sociais) boçal desse combate. Uma guerra que nunca será ganha e que faz muito mais vítimas fatais do que as drogas que tenta combater. Alguém ainda consegue achar irônico o fato do combate às drogas matar muito mais que o uso das mesmas?
6 Ninguém propõe o "bundalelê" nessa questão. A ideia de dar opção a quem não consegue ou não quer largar seu vício viria com a contrapartida de usar o ato de consumir drogas como agravante em qualquer delito que venha a ser cometido pelo usuário. Oferecer uma opção legal de consumo não é legalizar o crime. É retirar consumidores das mãos da marginalidade, é reduzir a importância econômica do narcotráfico. Certamente alguns morrerão de overdose, o que é triste, o que é lamentável. Mas, e a situação de hoje não é?
7 Reduzir o número de cadáveres deveria ser o único objetivo. Do jeito que as coisas estão organizadas parece que morrer de cocaína é pior do que morrer de tiro. Por quê? Querer discutir violência sem propor uma nova política de drogas é mais que perda de tempo, é perda de vidas.

Claudio Manoel - Humorista, integrante do grupo Casseta & Planeta
Jornal do Brasil, 13 jul. 2000 - caderno Opinião.

Assinale a alternativa em que a mudança de posição entre o substantivo e o adjetivo NAO pode acarretar alteração semãntica:

Escolha uma das alternativas.