UFU 2001

1    "O rápido desenvolvimento da engenharia genética está forçando uma reavaliação da questão do controle da pesquisa científica pelos órgãos legislativos. Este controle foi praticamente perdido durante a década de 70, quando as primeiras experiências envolvendo a manipulação explícita de genes foram desenvolvidas. O que existia antes, 'cruzar' animais ou plantas para criar novas raças ou híbridos, é coisa bem diferente, pois não envolve a manipulação direta dos genes. Todos sabem que cães e gatos são espécies diferentes e que não se misturam: entretanto, por meio da manipulação genética direta, essas duas espécies podem, em princípio, ser 'misturadas'.
2    Uma das técnicas mais comuns de manipulação genética é a passagem de genes de um organismo a outro usando vírus ou bactérias: os genes de um organismo são transplantados ao vírus, que, por sua vez, é implantado no organismo em que se deseja depositar o material genético. Esse organismo pode ser um peixe ou uma espécie de milho ou tomate. Com isso, os genes espalham-se pelo organismo, transformando seu material genético e, portanto, algumas de suas propriedades. Por exemplo, podem-se desenvolver espécies de milho resistentes a certos insetos que o usam como alimento, controlando geneticamente certas pragas agrícolas; ou um tipo de tomate que cresce mais rápido e é mais produtivo. Até aí tudo bem a ciência a serviço da população, como deveria ser. Podemos imaginar um futuro em que os alimentos modificados geneticamente irão solucionar um dos maiores problemas que afligem a humanidade, a fome. O dilema começa ao examinarmos os possíveis efeitos ambientais dos alimentos transgênicos.
3    Se microrganismos são usados como 'pontes' genéticas, transmitindo material de uma planta a outra ou de um animal a outro, como podemos nos certificar de que esse material não se espalhará para outras plantas ou animais? Para responder a essa questão, virologistas dos Institutos Nacionais de Saúde de (NIH) dos EUA desenvolveram experiência em que um gene causador de câncer em ratos foi transplantado para uma bactéria, que foi então implantada em outros animais, para observar se estes também desenvolveriam câncer. Em caso afirmativo, a experiência provaria que o câncer pode se tornar uma doença contagiosa por meio da manipulação genética. Os cientistas começaram errando, escolhendo uma bactéria frágil. Por quê? Por que eles não tinham nenhum interesse em comprovar os perigos da manipulação genética; existiam outros interesses em jogo - políticos, econômicos e também de controle da pesquisa científica. Mesmo assim, a bactéria infectou alguns animais com câncer, segundo os NIH. Esses resultados não foram publicados em jornais científicos, e o jornal 'The New York Times' anunciou, citando depoimento oficial dos NIH de 1979, que os 'riscos são menores do que o temido'. Caso encerrado!
4    Experiências recentes realizadas na Universidade de Cornell, nos EUA, mostraram que larvas da borboleta monarca que se alimentam de plantas impregnadas com o pólen de um tipo de milho transgênico morrem em grandes quantidades. Ainda é cedo para saber como os resultados se manifestarão fora do laboratório, mas o perigo existe. A verdade é que ainda não temos comprovação científica de que a manipulação genética de alimentos e animais não poderá gerar efeitos danosos à nossa saúde ou ao equilíbrio ecológico. Não acredito que seja possível impedir o desenvolvimento da pesquisa genética. Também jamais sugeriria tal coisa, que me parece absurda; a ciência precisa ter liberdade para progredir e uma legislação proibindo certos tópicos de pesquisa é, na minha opinião, equivalente à censura de imprensa ou à repressão da opinião pública.
5     Por outro lado, essa liberdade só pode funcionar se submetida a intensa supervisão da comunidade científica, aliada a órgãos governamentais, livre de interesses econômicos que possam comprometer os resultados. Existem questões éticas sérias que precisam ser debatidas abertamente com a sociedade, desde a criação de alimentos transgênicos até a manipulação de genes humanos. O Brasil deve tomar sua própria iniciativa, desenvolvendo critérios e experiências que testem  os efeitos da manipulação genética dentro de seus vários ecossistemas. Só assim poderemos transformar a manipulação genética em um dos maiores benefícios da ciência - e não em um monstro."

(Marcelo Gleiser, Folha de S. Paulo, 3 de setembro de 2000)
 

A conjunção OU nos fragmentos

"(...) transmitindo material de uma planta a outra OU de um animal a outro..." (par.3)

"(...) ainda não temos comprovação científica de que a manipulação genética de alimentos e animais não poderá gerar efeitos danosos à nossa saúde OU ao equilíbrio ecológico..."(par.4)
tem o valor semântico de

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