FMP 2018

Limites da manipulação genética

    Nos últimos anos, a possibilidade de manipulação genética de seres humanos se tornou tecnicamente real, o que levou à publicação de vários manifestos da comunidade científica internacional contra o uso da técnica em embriões, óvulos e espermatozoides humanos. Não aceitamos alterações genéticas que possam ser transmitidas às próximas gerações. Apesar disso, cientistas chineses publicaram um trabalho descrevendo a criação de embriões humanos geneticamente modificados! Abrimos a Caixa de Pandora?
    Ainda não. Os pesquisadores chineses só testaram o quão segura a técnica é de fato em embriões humanos – afinal, se um dia pudéssemos, por exemplo, corrigir a mutação no gene do câncer de mama, interromperíamos a herança genética familiar e os filhos não correriam o risco de herdar a doença.
    Se temos algo a ganhar com a técnica, não vale a pena testá-la? Sim, mas existe uma linha muito tênue entre ousadia e irresponsabilidade, e o desenvolvimento científico não pode cruzá-la. Assim, para ficar do lado de cá dessa fronteira, foram usados embriões defeituosos de fertilização in vitro. Neles foram injetadas pequenas moléculas construídas para consertar um gene que, quando "mutado", causa uma forma grave de anemia. Dos 54 embriões analisados, somente quatro tinham o gene corrigido... Além disso, eles também tinham alterações genéticas em outros locais não planejados do genoma – ou seja, a tal molécula muitas vezes erra o seu alvo...
    Em resumo, o trabalho demonstrou que a técnica de edição de genoma é ineficiente e insegura para se utilizar em embriões humanos – exatamente o que a comunidade científica previa e questionava, com o objetivo de que esse procedimento não fosse feito em embriões humanos.
    O que não significa que as pesquisas nesse sentido devam ser interrompidas. Se tivéssemos proibido as pesquisas em transplante cardíaco em 1968, quando 80% dos pacientes transplantados morriam, nunca teríamos tornado esse procedimento uma realidade que hoje em dia salva muitas vidas. Cientistas seguirão aprimorando a técnica para torná-la mais eficiente e segura. Porém, essas pesquisas devem ser conduzidas de forma absolutamente ética – aliás, todas as pesquisas devem ser conduzidas assim; mas, quando envolvem embriões humanos,
mais ainda.
    E enquanto nós, cientistas, resolvemos os aspectos técnicos, conclamamos legistas, psicólogos, sociólogos e a população em geral para discutir as vantagens e os riscos de usar a tecnologia de edição do genoma em seres humanos. Para pesquisar ou para evitar doenças como câncer e Alzheimer? Sim. E para que o bebê nasça com olhos azuis, mais inteligente, mais alto? Não. Em que situações permitiremos sua aplicação?
    Um cenário que, há 15 anos, era ficção científica agora é tão real que devemos discuti-lo urgentemente. No Brasil, já estamos precavidos: a Lei de Biossegurança de 2005 proíbe "engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano e embrião humano". Talvez um dia tenhamos que rever o texto para considerar casos específicos em que essa engenharia genética possa ser feita. Mas, por enquanto, estamos protegidos – que orgulho!

PEREIRA, L. O Globo. Opinião. 12 maio 2015. Disponível em:. Acesso em: 20 jun. 2017. Adaptado.

No texto, o trecho “Não aceitamos alterações genéticas que possam ser transmitidas às próximas gerações.” (ref. 1) estabelece, com a frase anterior, uma relação de

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